7.2.12

palavras como pequenas pedras

disseminadas no espaço negro da noite*


(...)
escreve uma vez mais essa palavra:
quero ver como fica dentro do meu coração






Ricardo Gil Soeiro
in espera vigilante

*Alejandra Pizarnik
in textos de sombra

2 comentários:

F.C. disse...

As palavras escritas no coração tornam-se sempre, para o bem e para o mal, cálculos. De início, ficam bem, etéreas, harmoniosas. Depois, precisam ser rescritas, mas o sentido muda: ou enriquecem ou laceram como lastro de alforra de ferro. Por outro lado, queremos acreditar que as redigimos apenas uma única vez e que perduram em muitos cambiantes que ali se mudam nelas, assim imutáveis e sempre diferentes. Com efeito, uma palavra é já um programa. Se conseguirmos ser-lhe fiel - tarefa ingente -, ela regrava-se automaticamente, reactualiza-se sozinha em cada minuto. Mas é bom que nos recordem como é a grafia, a forma, que lhe captemos a melodia por outra interpretação, como se, num cicio, ouvíssemos o sangue correndo intestinamente nela. Que as palavras, ao entrarem, fazem trom, como se mergulhassem dentro de uma memória escarlate, um mar, um programa líquido, ora de medida harmoniosa, ora em convulsão rasgando a pele cardial, perfurando a câmara. Às vezes, não conseguimos visualizá-las no código-língua, alojando-se em nós um analfabetismo penitenciador de meras bafagens sensitivas, de notações que mais vêm como hieroglíficas ondulações de perturbação mnésica, como se despertássemos de um sonho incerto de que não é possível lembrarmo-nos. E, pois, se todas as palavras coubessem apenas numa, assim grávida de todos os sentidos possíveis? Como se lhe soubéssemos de cor todas de que é capaz, nas batidas em cada inspiração? Em apagando-se, talvez já não saibamos escrevê-la de novo, porventura falhos do jeito caligráfico. Mas podemos ditá-la. Pulsando-lhe o eco em cada letra, como destilando cada entoação que se esvai do coração, quase morredoiro da palavra, que, ao ali chegar, fica à porta, numa estética de temporalidades. O futuro é futuro do passado. O futuro é sempre das pedras vivas em que dramaticamente o mundo acaba por ser. Um futuro telúrico que se volatiliza.

Jaime A. disse...

sim, faz com que seja
um quarto minguante
gravada no meu coração,
o opúsculo, a carta
(também)
ficam na memória
deste meu coração
de ouro...